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Onde a criatividade e a responsabilidade se encontram?

por Lucas Mello
Sep 30th, 2021 » 5 min (criatividade)

No momento em que a vacinação avança no país, ainda que a passos lentos, é inevitável pensar que poderemos, também a passos lentos, retomar a vida social depois de quase dois anos de isolamento. Para isso, é importante pensar qual o papel das marcas e da criatividade nesse processo. Sim, criatividade é essencial, já que emerge da adversidade. Quanto mais você tenta resolver um problema real, mais a sua criatividade aflora; é um mecanismo intrinsecamente humano para solucionar problemas.

 

As marcas possuem um valor que extrapola, e muito, o valor do produto em si. As marcas inspiram comportamentos, confiança, estilos de vida. Por consequência, modulam também os comportamentos das companhias que as representam na responsabilidade com esses públicos. É uma relação social e comercial complexa, que não pode ser ignorada. 

 

No início da pandemia, essa responsabilidade ficou muito evidente no estímulo à segurança sanitária: empresas cujo negócio é bebidas, ajudando na fabricação de álcool em gel, investindo em hospitais, ajudando financeiramente os negócios intermediários (como bares, restaurantes e distribuidoras) e valorizando as suas marcas ao se associarem diretamente a esta busca responsável pelo bem-estar do seu público e de toda a população. Ou seja, a responsabilidade da marca extrapola o produto em si. É preciso estar junto de outras formas. 

 

O sociólogo Nicholas Christakis, da Universidade Yale, salienta que depois de períodos de pandemia e isolamento como o que vivemos hoje, a humanidade tem a tendência a festejar. É um período de intensificação de relações, alegria e festejos. Em um papo com o Daniel Wakswaser, VP de Marketing da AmBev, no podcast 22000 pés, ele conta que esse período já está sendo planejado como "ideias para a euforia". 

 

Ouça o episódio #14 do 22000 pés aqui.

 

Desse papo, destaco quatro pontos fundamentais para como pensar a ação das marcas nesse período vindouro de retomada de relações sociais offline - e eufóricas - possibilitadas pela imunização: 

 
  1. responsabilidade: já é possível vislumbrar a luz no fim do túnel principalmente pelo exemplo de outros países. Israel, Inglaterra, Austrália já passam por um movimento de permitir algumas aglomerações, com idas a bares e pubs, shows, festivais. Mas é preciso ter em mente que é preciso migrar de um modelo de isolamento total, com eventos propícios a essa regulação de segurança (com as lives, pequenos encontros caseiros com amigos), para eventos coletivos maiores, com responsabilidade. Como Daniel destacou na nossa conversa, o Brasil é um caso único, em que os protocolos de distanciamento nunca foram totalmente incorporados e que, mesmo com a vacinação, ainda há um índice de contágio alto, mesmo que o número de mortes diárias esteja em declínio. É preciso ir com calma e planejar levando em conta o tempo que vai levar para uma taxa de imunização total da população mais segura. 

  2. visão plural: hoje há uma visão maniqueísta de que as coisas são uma coisa ou outra, A ou Z, como se não houvesse uma extrema complexidade e nuances entre um pólo e outro. Da mesma forma, não é possível pensar a atualidade como "um novo normal" em oposição a um "velho normal". Algumas mudanças que sentimos nos modos de consumo, por exemplo, foram aceleradas pela pandemia, mas já eram uma realidade para onde o mundo já trilhava. O mesmo em relação ao consumo midiático. Algumas redes sociais tiveram um boom de acessos e produção de conteúdo, especialmente audiovisual, como YouTube e TikTok. Com o fim da pandemia e as relações acontecendo offline, mesmo que exista um desejo de "mais vida, menos telas", as pessoas se habituaram a consumir esse tipo de conteúdo, já está assentado no dia a dia. É uma questão de entender os desejos das pessoas e adaptá-los ao que se sabe, equilibrar as coisas porque elas vão continuar coexistindo. 

  3. entender que algumas mudanças vieram para ficar: algumas alterações no consumo e no mundo do trabalho que foram feitas em função da pandemia não possuem ponto de retorno. Hoje temos consciência de que não é necessário ter toda uma equipe o tempo todo no mesmo espaço físico para que o trabalho seja feito de forma eficiente. Da mesma forma, o conforto do consumo online, com as melhoras expressivas em termos de entrega, é outro fator que deve ser levado em consideração. A pandemia também trouxe a realidade da imprevisibilidade. Se há duas décadas todas as ações precisavam ser pensadas para saber exatamente os desdobramentos esperados, durante o período da pandemia precisamos pensar ainda mais fora da caixa e desenvolver metodologias que incorporem o erro como parte do processo, de incorporar cada vez mais pessoas, de diversas áreas ao processo criativo.  

  4. incorporar a diversidade: e essa é a deixa para o quarto ponto. A diversidade favorece a criatividade. E esse é um ponto do diálogo atual da sociedade que não deve ter um ponto de retorno, mas de aprimoramento. A pandemia realça diariamente as diferenças e desigualdades na sociedade brasileira e a busca por espaços (e ações) mais democráticos, mais inclusivos, mais receptivos devem estar sempre no radar. E, claro, só é possível fazer isso começando pelos nossos círculos mais íntimos de convivência e trabalho. 
 

É importante poder olhar para 2022 com esse lampejo de esperança, de anseio por essa euforia. Mas é importante também manter um olho no presente, nos cuidados que ainda são necessários para que consigamos chegar lá com o equilíbrio necessário. Ainda há um caminho desafiador a ser trilhado antes da festa. 

 

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